Queijos artesanais fabricados com leite cru fazem parte da cultura de várias regiões do Brasil. Estes produtos são feitos a partir de diferentes técnicas, passadas de geração em geração, que acabam por conferir a cada queijo características sensoriais particulares. A fabricação de queijos em propriedades rurais é uma forma de transformar e conservar o excedente de leite produzido, diversificando-se assim as formas de consumo de produtos lácteos.
Dependendo da região em que os queijos artesanais são produzidos, observam-se importantes diferenças de características físico-químicas, sensoriais e microbiológicas. Dentre os queijos artesanais de mais conhecidos e consumidos no Brasil, destacam-se: o queijo Minas, produzido no Estado de Minas Gerais; o queijo Serrano, típico do Estado de Santa Catarina; o queijo Colonial, comum na região Sul do país, e; o queijo coalho e o queijo manteiga, típicos das regiões Nordeste e Norte, respectivamente.
Todos esses queijos têm certos fatores em comum que os caracterizam e os classificam como queijos de produção artesanal: a produção em pequena escala, associada à agricultura familiar, e a fabricação a partir de leite cru, produzido na mesma propriedade. A fabricação destes queijos é uma tradição que pode e deve ser mantida; o produtor rural tem o direito de fazer e consumir o queijo feito em propriedade, com leite cru, segundo suas técnicas tradicionais, desde que seja para consumo próprio.
A partir do momento que este produto é colocado para venda ao público
Sua qualidade e especificações técnicas, bem como a estrutura do estabelecimento de fabricação devem obrigatoriamente atender aos regulamentos estabelecidos pelo Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (MAPA) e pela Vigilância Sanitária. A implantação das Boas Práticas de Fabricação torna-se fundamental, a começar pelo local onde o queijo será fabricado. As instalações da queijaria devem atender às condições essenciais no que se refere à edificação: ser de alvenaria, com materiais que facilitam a higienização, com controle de pragas, abastecida com água tratada, além de uma série de outros requisitos que visam à higiene durante fabricação e conservação do queijo. Muitas pessoas acreditam que estas regras são exageradas e que inviabilizam a produção em escala artesanal. Contudo, vale ressaltar que o objetivo destas exigências, impostas a qualquer tipo estabelecimento que produza alimentos, visa a segurança do consumidor final.
O leite utilizado na produção de queijos deve atender critérios mínimos de qualidade
Como baixa contaminação microbiana e níveis controlados de células somáticas, obtido de rebanho vacinado e livre de brucelose e tuberculose. Para aqueles queijos com tempo de maturação inferior a 60 dias, devem ser realizados estudos que comprovem sua inocuidade microbiológica, conforme descrito na legislação em vigor.
O tempo mínimo de maturação de queijos artesanais produzidos no Brasil é uma questão que tem gera bastante discussão, uma vez que a maioria destas é de curta maturação. Ainda assim, é perfeitamente viável a fabricação de queijos artesanais que atendam às exigências de segurança alimentar, mesmo com tempo de maturação inferior a 60 dias. Basta que os requisitos de sanidade do rebanho e higiene na produção sejam plenamente respeitados. Sob estas condições de higiene, as bactérias láticas e outros fatores intrínsecos presentes no queijo exercem importante papel na inibição de micro-organismos indesejados, garantindo a inocuidade do produto.
Infelizmente, muitos produtores artesanais ainda não se adequaram às exigências estabelecidas pela legislação e a qualidade microbiológica dos queijos por eles produzidos muitas vezes não atende os limites estabelecidos para contagem de Coliformes, Staphylococos aureus, Salmonella e Listeria monocytogenes (para queijos de média e alta umidade) podendo representar um risco para pessoas com baixa imunidade, idosos, crianças e grávidas.
Vários surtos alimentares relatados no Brasil já foram associados ao consumo de queijo
Sendo, na maioria dos casos causados por intoxicação estafilocócica, onde o leite cru aparece como principal veiculador desta bactéria. Queijos de média e alta umidade também já foram associados a surtos causados por Listeria monocytogenes, bactéria capaz de causar infecções severas, como septicemias, encefalite, meningite e aborto, com alta taxa de hospitalização e óbitos.
A alta contaminação dos queijos produzidos no Brasil é associada a deficiências no manejo sanitário do rebanho e falhas na adoção de boas práticas de produção. A elevada proporção de casos de mastite no rebanho leiteiro, associado a falta de higiene da ordenha e a estocagem inadequada do leite são as principais causas da produção de queijos com elevados níveis de contaminação.
Apesar da fabricação de queijos com leite cru estar regulamentada no Brasil, grande parte dos produtores de queijos artesanais ainda estão longe de atender seus requisitos, pois não existem, paralelo à estas normativas, políticas públicas para treinamento e orientação destes produtores. Alguns avanços têm ocorrido nos últimos anos buscando a regulamentação da produção artesanal e viabilizar a produção em pequena escala. Para que isto aconteça, os produtores devem demonstrar interesse em se capacitar e formalizar sua atividade e novas políticas publicas devem ser adotadas para a viabilização desta atividade.
Apesar de todas as dificuldades, encontramos no Brasil excelentes exemplos de queijos
Feitos com leite cru por produtores que se capacitaram e investiram para atender os requisitos higiênico-sanitários necessários para a comercialização deste produto, sendo alguns reconhecidos internacionalmente por seu sabor e qualidade. A valorização deste produto tão importante para nossa cultura gastronômica deve focar na capacitação dos produtores para que seus queijos, além de saborosos e tradicionais, sejam seguros para o consumidor.