Sustentabilidade! Como você se posiciona sobre o tema? Se você é daqueles que pensam que não há um problema (ou talvez vários) em relação ao modo como nos relacionamos com meio ambiente, ou se você até reconhece que há a necessidade de melhorar essa relação, mas não sabe muito bem o que fazer, além de separar o lixo reciclável em casa e no trabalho, fique tranquilo. Aqui não tenho a intensão de te convencer a salvar o planeta, mas sim refletir sobre as possibilidades de um cenário de atividade econômica com menos impacto ambiental.
Para isso vou adotar uma perspectiva de Design além das questões estéticas e funcionais. Acredito no valor estratégico do Design. Portanto, quando se inclui a pauta ambiental nos negócios, olha-se além de recursos, materiais e energias ecológicas, para ficar no senso comum. Para visualizar novos cenários de convido a adotar uma forma de pensamento de design, isto é, dizer mais e se for..., ao invés de isso não funciona para criar, imaginar e modelar algo novo.
O ponto de partida, independente das percepções pessoais, é reconhecer que há um crescimento do consumo consciente, isto é, quando as decisões de comprar são motivadas ou influenciadas por aspectos qualitativos e valorativos que extrapolam o propósito básico de um produto ou serviço. Os aspectos de cuidado com o meio ambiente é um deles. Atenção, este texto não vai falar de marketing verde ou ecológico, não é disso que se trata. A ideia é pensar em novos negócios mais eco-eficientes, especialmente para empresas voltadas à produção de produtos. Qualquer produto? A princípio, sim: eletrodomésticos, bicicletas, carros, móveis, produtos de limpeza e assim vai. Vamos lá?
E se (!) a empresa continuasse proprietária dos produtos que produz, uma fábrica de móveis por exemplo, e disponibilizasse seus produtos através de aluguel ou assinatura, incluindo diversos serviços, como montagem, manutenção, substituição? A ideia central é o foco no benefício oferecido, viabilizando o acesso através de um mix de produtos & serviços integrados, isto é, um sistema. Escrevi mais sobre isso no artigo O que você quer mesmo? Adote o Design como ponto de partida. Resumindo: ao invés de uma máquina de lavar roupas, ter as roupas limpas e bem cuidadas, ao invés de um purificador de água, ter água limpa e saudável. Este discurso não é exatamente novo, contudo, observa-se que algumas empresas consolidadas em seus segmentos de atuação estão adotando novos modelos de negócios baseados em um sistema produto-serviço. Neste sistema os serviços não são processos acessórios da venda, mas sim parte fundamental da oferta da solução. Seguindo...
E se o desafio for conceber novos sistemas produtos-serviços intrinsecamente sustentáveis? E por quê? De um lado temos a tendência do aumento dos custos relacionados ao consumo de energia e ao descarte de lixo e resíduos; de outro, uma parcela crescente de pessoas que não apenas dão preferência a produtos e serviços de baixo impacto ambiental, como também passam a repensar suas reais necessidades de consumo. Logo, há uma agenda que será cada vez mais importante para as empresas. Gostaria de abordar algumas características deste modelo, algumas diretrizes favoráveis para reduzir o impacto ambiental e especialmente as vantagens para o negócio.
Considerando a condição de proprietária do produto, a empresa produtora tem maior (e os principais) meios de controle sobre o Ciclo de Vida do Produto, o que contribui significativamente para as decisões que afetam seu público-alvo, que sejam viáveis economicamente e que apresentem, comparativamente, índices menores de impacto ambiental. O Ciclo de Vida do Produto aqui abordado corresponde às etapas relacionadas ao nascimento, vida e morte de um produto, considerando seus fluxos de materiais, energia e emissões. São elas: pré-produção, produção, distribuição, uso e descarte.
As diretrizes de eco-eficiência são variadas e dependem de fatores mercadológicos e do próprio benefício a ser entregue. Contudo, em linhas gerais pode-se imaginar numa oferta de produto-serviço que haverá maior interesse e vantagem para a empresa ao desenvolver produtos mais duráveis, com menos consumo de energia, com uso racional de materiais, menor emissão e lixos industriais. Na redução de custos associados a consumo e descarte, por exemplo, a economia pode ser redirecionada à construção de novos produtos em substituição àqueles que já não podem sem utilizados. Destes, pode-se adotar o processo de reutilização de componentes em bom estado de uso em processos de manutenção. Assim, os próprios projetos de produtos passam a seguir diretrizes que facilitam a desmontagem e intercâmbio de componentes. A revalorização dos materiais descartados também ganha importância reduzindo a necessidade de novas aquisições.
Pelo caráter coletivo ou compartilhado do produto-serviço, haveria um uso mais intenso, que na perspectiva da sustentabilidade é positivo pois reduz a quantidade de produtos necessários para satisfazer uma determinada comunidade. Portanto, um modelo de negócio de produto-serviço sustentável buscará:
- uso mais eficiente dos recursos a partir da minimização e escolha de recursos de baixo impacto ambiental;
- uso mais intenso dos mesmos produtos;
- prolongamento da vida útil dos produtos;
- extensão da vida dos materiais.
Claro que não é uma mudança fácil, mas ela já está acontecendo e deve se intensificar. Há também um desafio adicional, que é a percepção de que a oferta de serviços seria menos econômica que a posse individual do produto. Contudo, há de se considerar também as diferenças de público-alvo que impactam na viabilidade, relação empresa-consumidor ou empresa-empresa. Para sua casa provavelmente não seria interessante alugar permanentemente o mobiliário, mas para uma escola ou universidade, por exemplo, os custos de aquisição, manutenção, atualização, descarte e gestão apresentam uma outra realidade.
Os projetos de Design de produtos-serviços para serem mais econômicos e socialmente atrativos precisam considerar e incluir as novas tecnologias, inclusive de informação e comunicação, e também de um novo papel dos usuários, sendo atores mais ativos e participativos em uma ou mais fases da jornada de uso.
Por fim, para alguns segmentos a reconversão do negócio de venda de produtos para um serviço pode contribuir para ativar um relacionamento mais próximo e duradouro com os clientes. Isto é uma possibilidade muito valiosa, pois entre outros pontos, contribui para a identificação de suas necessidades não atendidas, compreendendo mais profundamente o produto nas condições reais de uso, permitindo melhorias mais assertivas e colhendo novos insights para inovação. Num mundo que aceleradamente muda valores, comportamentos, tecnologias e padrões de consumo, construir este relacionamento também me parece ser mais um componente na busca pela sustentabilidade.
Ficou com alguma dúvida, gostaria de mais informações ou compartilhar alguma ideia, fique à vontade para comentar.
Abraços
PS. Fonte de referência: Manzini; Vezzoli. O desenvolvimento de Produtos Sustentáveis. São Paulo, Udusp, 2002.